domingo, 15 de abril de 2012

Fibromialgia


A fibromialgia é um distúrbio doloroso crônico que se caracteriza por dores musculares generalizadas, rigidez e cansaço, além de outros sintomas locomotores. Acomete mais mulheres( 9: 1), aparecendo em todas as idades, embora o quadro tende a se manifestar mais frequentemente a partir da quarta ou quinta década de vida. Das doenças reumatológicas, é segunda mais comum, com prevalência de 2,5 % da população brasileira, logo após a osteoartrite.

As primeiras descrições históricas foram documentadas em 1843 na Alemanha, quando Froriep descobriu pacientes com pontos rígidos nos músculos, dolorosos à digitopressão. No início do século XX, o quadro recebeu o nome de miosite intersticial, evoluindo para fibrosite em 1904. Nessa época outros sinais patológicos foram identificados, além da dor, como a presença de fadiga, ausência de sinais inflamatórios e sono conturbado. Os sintomas pioravam com a exposição ao frio ou esforço muscular excessivo. Durante seis décados o transtorno ficou reputado por alguns como dor muscular de origem inflamatória e por outros como tensão ou "reumatismo psicogênico". As biópsias e estudos histopatológicos não revelavam lesão inflamatória.

O termo fibromialgia foi introduzido na literatura em 1977, quando se identificaram os tender points , pontos sensíveis à digitopressão. Foi observado distúrbio na arquitetura do sono, estágio 4 do sono Não REM. Posteriormente um comitê multicêntrico, composto por reumatologistas americanos, estabeleceu os critérios diagnósticos em 1990. Os critérios exigiam a presença de dor afetando o esqueleto axial e periférico, acima e abaixo da linha de cintura, além do achado de 11 dos 18 tender points específicos.

Estudos epidemiológicos , nos EUA, detectaram a prevalência de 3,5 % em mulheres e 0,5% em homens na população geral acima de 18 anos de idade. Vários outros países estudaram a prevalência do transtorno na população, sendo alguns resultados conhecidos: Noruega- 10,5 %, Inglaterra, 3,3 % Canadá, 2 % , Rússia - 13,3%.

A causa da doença permanece desconhecida. A maioria dos pacientes não identifica fatores desencadeantes ambientais. Quando há relação temporal com o surgimento dos sintomas, os principais eventos são trauma de acidentes automobilísticos, estresse emocional e infecção viral( Hepatice C, HIV, parvovirose, candidíase e coxsackie). Mas não se firmou nenhuma causa como responsável etiológica da síndrome.

A microscopia dos tecidos musculares não mostram alterações significativas em relação às pessoas não
acometidas. Cerca de 80 % dos pacientes apresentam níveis mais baixos de condicionamento aeróbico. Portanto, anormalidades metabólicas e diminuição de oxigenação dos tecidos musculares parecem exercer influência na dor nos tender points.

Hipóteses atuais ressaltam mecanismos centrais na modulação ou amplificação da dor no surgirmento da fibromialgia. Haveria um descontrole dos mecanismos centrais do controle da dor, resultante da disfunção de neurotransmissores, principalmente os neurotransmissores inibitórios em níveis espinhais e supraespinhais( serotonina, encefalina e norepinefrina) ou hiperativação dos neurotransmissores excitatórios( glutamato, substância P, bradicinina e peptídeos).

A vulnerabilidade à fibromialgia é influenciada por fatores genéticos, ambientais e hormonais, produzindo alterações neuro-hormonais, com desequilíbrio do eixo hipotálamo-hipófise-adrenal. A qualidade do sono contribui para intensificação dos sintomas fibromiálgicos, pois já se conseguiu induzir sintomas de fibromialgia-like em pessoas saudáveis , após perturbação do sono. Mecanismos envolvendo o neurotransmissor serotonina explicariam uma gama de alterações na fibromialgia, como aumento da sensibilidade à dor, anomalias no sono , depressão e liberação da substãncia P.

Os Exames de neuroimagem funcional demonstraram diminuição do fluxo sanguíneo em regiões bilaterais do tálamo e núcleo caudado( envolvidos na integração e percepção de sinais dolorosos e regulação do eixo hipotálamo-hipófise-adrenal). Demonstrou-se também redução do fluxo sanguíneo em regiões corticais parietais e fronto-temporais, denotando um possível déficit primário ou secundário em nível do Sistema Nervoso Central. Em suma, diversas anormalidades estão presentes na fibromialgia, nenhuma delas é patognomônica para o diagnóstico, mas ajudam a entender os mecanismos fisiopatológicos subjacentes.

O sintoma principal é a dor músculo-esquelética difusa e crônica, que geralmente inicia num sítio anatômico- particularmente  região cervical e membros superiores- e depois se generaliza. A dor é em queimação, contusão ou peso, pode irradiar-se. Os pacientes queixam-se de cansaço , já percebido ao despertar e com piora no fim da tarde. Nesse caso, deve-se estar atento para uma outra comorbidade, a síndrome da fadiga crônica. Apresentam rigidez muscular e articular, com limitação da amplitude dos movimentos. O sono costuma ser perturbado, com muitos despertares noturnos, o que o impede de ser restaurador.

Diversas especialidades médicas atendem pacientes portadores de fibromialgia, devido à heterogeneidade de sintomas. Em 50 % dos casos os pacientes manifestam cefaleia tensional e enxaqueca. Além disso,apresentam constipação crônica, síndrome do cólon irritável, dormência em membros superiores, disúria, polaciúria, desconforto urinário, tonturas, zumbidos, dismenorréia, dificuldades de digestão, memória e concentração.

Muitos autores consideram a fibromialgia como uma subvariante da doença depressiva ou  um distúrbio do espectro afetivo. Mais de 50 % do pacientes com fibromialgia apresentam precedentes depressivos na sua história psiquiátrica. Apesar disso, a tendência atual é considerá-la uma afecção reumatológica comum em pacientes com transtornos psiquiátricos, devendo todos os quadros nosológicos serem considerados  independentes  e tratados simultaneamente.

Não existe um tratamento único, cada caso clínico  dependerá de uma abordagem multidisciplinar. O prognóstico é reservado. Apesar dos avanços e das melhoras clínicas observadas nos últimos anos, a maioria dos pacientes mantém sintomas residuais a longo prazo. Deve-se estimular a evitação de fatores agravantes e contribuitivos, como estresse emocional e hábitos de vida pouco saudáveis( etilismo, tabagismo), além de tratar os distúrbios psicogênicos associados. Atividades físicas regulares envolvendo alongamento e exercícios aeróbicos, como natação e caminhadas, são bem tolerados. A prática da Ioga , meditação e o apoio complementar de fisioterapia ajudam a minorar os sintomas e melhorar a qualidade de vida.

Muitos recursos farmacológicos estão disponíveis atualmente tanto para o tratamento da dor , como das condições clínicas associadas.

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